§ Aqueles para quem a
existência não tem qualquer sentido.
Encontram-se dois filósofos
que se enquadram nesta perspectiva: os franceses J.P. Sartre e Albert Camus.
Vamos começar por este
último. O texto entregue pelo vosso professor é retirado do livro O Mito de Sísifo. Sísifo é para Camus o
protótipo de existência, na medida em que revela o absurdo que a caracteriza.
Sísifo foi um gigante condenado pelos deuses a empurrar eternamente até ao topo
de uma montanha uma pedra que cai sem cessar mal é colocada lá no cimo. É uma
situação absurda, esta do gigante! Transporta a pedra sabendo que vai
imediatamente cair depois do esforço desempenhado. Para Camus, o homem é como o
gigante, desenvolve um trabalho inútil e sem esperança. Contudo, nem tudo é
negativo. Sem qualquer tipo de constrangimento, o gigante, tal como o homem,
está entregue a si mesmo, nada o ultrapassa, está vinculado ao seu próprio
esforço. Para Sísifo, como para a humanidade, tudo está bem. O Homem absurdo
diz sim e o seu esforço nunca mais cessará, ele sabe-se senhor dos seus dias.
Nada existe que o suplante e o negue, nada há que o transcenda. Aquando da sua
condenação pelos deuses, obviamente que Sísifo sentia o enclausuramento, porém,
à medida que a sua eterna tarefa prosseguia, Sísifo foi tomando consciência que
estava só, entregue a si mesmo, sem qualquer tipo de acção divina. Sentia-se livre.
Talvez seja esta a especial e única predilecção humana: ser feliz com o seu
próprio esforço.
- Deveis estar assim a pensar: Estes indivíduos não tinham mais nada
para fazer?
J.P. Sartre, filósofo francês, viveu numa época que tornava urgente uma reflexão
acerca do homem. Após a Segunda Guerra Mundial, que devastou o mundo, muitas
perguntas se fizeram quanto ao sentido da existência. Obviamente que, enquanto
há prosperidade económica as pessoas nem sequer têm tempo de pensar nelas
próprias, mas, quando o Homem se depara com situações de destruição e crise,
tem necessidade de se questionar.
Na linha de Camus, Sartre
diz: a existência precede a essência.
Esta asserção sintetiza de forma evidente toda a filosofia de Sartre.
Basicamente, esta frase evidencia que nada predestina o Homem. É ele que se faz
a si próprio. Este modo de se fazer possui, porém, aspectos relevantes. Fazer
significa existir. Mas como devemos existir? Existimos como um «eu» se optar,
construir, desejar, escolher, demonstrar vontade. Ou seja, o homem só tem uma maneira
de existir, é fazendo-se. Na medida em que ele não está já feito, a sua
essência, aquilo que ele é, consiste numa permanente construção contínua desse
«eu» no sentido de construir a sua própria liberdade.
Sem Deus, com o homem
entregue a si próprio, ele está condenado a ser livre. Torna-se inevitável ao
homem exercer a liberdade, tornando-se ele próprio dono das suas decisões e
opções e, por isso, o único responsável por tudo aquilo que faz. O homem não
encontra fora de si algo a que se possa apoiar, como muleta das suas
desventuras. Não! O homem encontra-se a si próprio, está abandonado, para o bem
e para o mal. É por este motivo que todas as pessoas reclamam pela liberdade,
mas nem toda a gente sabe exercê-la.
§ Aqueles para quem a
existência tem um sentido.
É comum conotar uma parte da
filosofia existencialista com uma vertente cristã. Efectivamente existem
filósofos como Kierkegaard, Mounier, Gabriel Marcel, que introduzem na questão
da existência a presença de algo que transcende o Homem. A vertente espiritual
do homem é predominante na análise que estes filósofos fazem acerca do sentido
da vida. O conceito de pessoa, como entidade espiritual, liga-se a uma
mundividência (uma visão do mundo) que não abdica de uma entidade supra-individual
(que ultrapassa o indivíduo). Assim sendo, a pessoa realiza-se e encontra o seu
sentido quando age e caminha em direcção à sua realização espiritual e, por
consequência, segue os caminhos trilhados por essa entidade divina. Num texto
que Kierkegaard escreveu mostra-se
como a vida do homem deverá ser. Assim, retrata a vida de Abraão como exemplo
da realização plena do homem. Sabem que Abraão era um profeta que esteve,
segundo relatos bíblicos, perante Deus. Este, para avaliar a sua fé, exige que
Abraão mate o filho. Perante este aparente absurdo, este incomensurável
desequilíbrio emocional, este paradoxo, como a sua fé era grande, Abraão pegou
logo no filho para executar a ordem. Eis senão, Deus, perante aquele desempenho
religioso, ordenou que parasse. Esta história serve para Kierkegaard
exemplificar em que consiste a existência autêntica do Homem e a sua verdadeira
realização como ser predominantemente espiritual.
Este patamar da vida do
Homem diferencia-se daquelas formas existenciais que se caracterizam por querer
gozar a vida somente através do prazer corporal (comer bem, dormir bem, entre
outras coisas). A estes Kierkegaard situa-os num estádio existencial estético.
Além destes, existe outro estádio apelidado de ético. Apesar deste se
caracterizar por uma vertente moral (fazer o bem ao próximo, não abusar das
pessoas, etc), nunca se assemelha à qualidade existencial do estádio religioso,
descrito anteriormente.
§ Aqueles para quem é o
próprio ser humano que constrói o sentido da sua existência.
Alguns pensadores, não
acreditando em algum plano divino que forneça sentido à vida, depositam no
próprio homem as suas esperanças. K. Marx e Nietzsche, dois filósofos alemães
do séc. XIX, protagonizaram esta vertente existencial. Para Nietzsche, o homem,
com a morte de Deus, encontrou-se consigo mesmo realizando a sua própria
essência através das criações. Por este motivo, todo o homem deveria
construir-se como super-homem (não estou a brincar, a expressão é mesmo de
Nietzsche), abdicando de qualquer cultura de rebanho em que as ovelhas
seguem o pastor como se fossem meros
servis. Este novo alento dado ao Homem desencadeou uma recuperação do valor
dado ao poder de transformar, ao poder de cria. Assim, o sentido da vida
encontra o seu relevo no próprio homem e na capacidade que ele possui de
realização.
Outras teorias filosóficas
florescem neste meio. É o caso das utopias difundidas acerca da construção de
uma espécie de paraíso na Terra, como é exemplo o Comunismo. Não entrando em
divagações, poderemos dizer que também estes filósofos realçam o poder do
Homem, demonstrando uma confiança nas suas capacidades. Este optimismo é fruto
da perspectiva que considera o Homem como fazedor da realidade e da história, e
cuja construção leva a uma progressiva melhoria da situação existencial, na
medida em que se criam sistemas cada vez mais perfeitos de justiça, liberdade e
solidariedade. Em suma, estas tendências filosóficas pretendem que o Homem reassuma
o seu lugar no cosmos, assumindo a sua insignificância e a sua fragilidade e,
por isso, a tomada de consciência acerca das suas próprias possibilidades. A
noção do desenvolvimento só provém do facto do Homem ser perfeitamente frágil e
imperfeito.