domingo, 18 de novembro de 2012

Dia internacional da Filosofia na Madeira Torres






Foi agradável a aula comemorativa do Dia Internacional da Filosofia. Jogámos com a surpresa do princípio ao fim. Substituímos a professora de matemática nos últimos 50 minutos e até ao fim os alunos não sabiam o que lhes estava a acontecer. Começámos por apresentar a data de hoje, dizendo-lhes que era uma data importante. Porquê? «Faz anos hoje», afirmavam. Aproveitei para enveredar por questões antropológicas: vale a pena comemorar anos? Para não os deixar deprimidos, coloquei a grande questão: O que estamos aqui a fazer? A resposta criou um razoável número de conceitos que pura e simplesmente demonstrou que devemos guiar muito bem os nossos raciocínios e questionar aquilo que julgamos certo. No fim houve palmas. O departamento de Filosofia agradece ao 9ºF da Madeira Torres. Reencontrar-nos-emos para o próximo ano.

António Daniel

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

David Hume





David Hume. O Problema da Indução
Situando-se num âmbito empirista, Hume inscreve a justificação do conhecimento na experiência. Tal como Locke, Hume faz derivar todos os conteúdos da mente na experiência, mas diferencia-se ao utilizar os conceitos de Impressões e ideias. As primeiras são os dados imediatos da experiência; as segundas são cópias das primeiras. A uma ideia corresponde sempre uma impressão. Como se processa este mecanismo? Por outras palavras, como é que as impressões se tornam ideias?
Quando olho para um objecto, obtenho uma impressão. Quando fecho os olhos, obtenho uma ideia. Assim, esta não é mais que uma cópia da primeira. Mas Hume não se fica por aqui. Também distingue as impressões em simples e complexas, assim como distingue ideias simples das complexas. A impressão de uma cor irá corresponder a ideia dessa cor na sua própria ausência. De uma impressão simples obtemos uma ideia simples. Contudo, quando vislumbrar uma pintura, capto uma impressão complexa a que irá corresponder uma ideia complexa desse quadro. Conclui-se daqui que as impressões precedem as ideias. As ideias funcionam, portanto, como o surgimento das impressões, como a recordação das impressões. Ora, Hume apresente duas formas de reaparecimento das impressões: a imaginação e a memória. Quais as diferenças entre as ideias de memória e as ideias de imaginação?
A resposta poderá reportar-se à forma como se combinam as ideias simples. Enquanto a memória conserva as ideias simples nas suas disposições originas, a imaginação introduz metamorfoses nessa disposição, a imaginação combina livremente as ideias simples ao passo que a memória reproduz fielmente a ordem. Esta atitude combinatória revela, para Hume, uma predisposição inata do ser humano para a regularidade, para a disposição sincrónica e diacrónica das ideias, estando na base da ideia de causalidade.

segunda-feira, 4 de junho de 2012

O Sentido da Existência II


§  Aqueles para quem a existência não tem qualquer sentido.



Encontram-se dois filósofos que se enquadram nesta perspectiva: os franceses J.P. Sartre e Albert Camus.



Vamos começar por este último. O texto entregue pelo vosso professor é retirado do livro O Mito de Sísifo. Sísifo é para Camus o protótipo de existência, na medida em que revela o absurdo que a caracteriza. Sísifo foi um gigante condenado pelos deuses a empurrar eternamente até ao topo de uma montanha uma pedra que cai sem cessar mal é colocada lá no cimo. É uma situação absurda, esta do gigante! Transporta a pedra sabendo que vai imediatamente cair depois do esforço desempenhado. Para Camus, o homem é como o gigante, desenvolve um trabalho inútil e sem esperança. Contudo, nem tudo é negativo. Sem qualquer tipo de constrangimento, o gigante, tal como o homem, está entregue a si mesmo, nada o ultrapassa, está vinculado ao seu próprio esforço. Para Sísifo, como para a humanidade, tudo está bem. O Homem absurdo diz sim e o seu esforço nunca mais cessará, ele sabe-se senhor dos seus dias. Nada existe que o suplante e o negue, nada há que o transcenda. Aquando da sua condenação pelos deuses, obviamente que Sísifo sentia o enclausuramento, porém, à medida que a sua eterna tarefa prosseguia, Sísifo foi tomando consciência que estava só, entregue a si mesmo, sem qualquer tipo de acção divina. Sentia-se livre. Talvez seja esta a especial e única predilecção humana: ser feliz com o seu próprio esforço.



- Deveis estar assim a pensar: Estes indivíduos não tinham mais nada para fazer?



J.P. Sartre, filósofo francês, viveu numa época que tornava urgente uma reflexão acerca do homem. Após a Segunda Guerra Mundial, que devastou o mundo, muitas perguntas se fizeram quanto ao sentido da existência. Obviamente que, enquanto há prosperidade económica as pessoas nem sequer têm tempo de pensar nelas próprias, mas, quando o Homem se depara com situações de destruição e crise, tem necessidade de se questionar.

Na linha de Camus, Sartre diz: a existência precede a essência. Esta asserção sintetiza de forma evidente toda a filosofia de Sartre. Basicamente, esta frase evidencia que nada predestina o Homem. É ele que se faz a si próprio. Este modo de se fazer possui, porém, aspectos relevantes. Fazer significa existir. Mas como devemos existir? Existimos como um «eu» se optar, construir, desejar, escolher, demonstrar vontade. Ou seja, o homem só tem uma maneira de existir, é fazendo-se. Na medida em que ele não está já feito, a sua essência, aquilo que ele é, consiste numa permanente construção contínua desse «eu» no sentido de construir a sua própria liberdade.

Sem Deus, com o homem entregue a si próprio, ele está condenado a ser livre. Torna-se inevitável ao homem exercer a liberdade, tornando-se ele próprio dono das suas decisões e opções e, por isso, o único responsável por tudo aquilo que faz. O homem não encontra fora de si algo a que se possa apoiar, como muleta das suas desventuras. Não! O homem encontra-se a si próprio, está abandonado, para o bem e para o mal. É por este motivo que todas as pessoas reclamam pela liberdade, mas nem toda a gente sabe exercê-la.



§  Aqueles para quem a existência tem um sentido.



É comum conotar uma parte da filosofia existencialista com uma vertente cristã. Efectivamente existem filósofos como Kierkegaard, Mounier, Gabriel Marcel, que introduzem na questão da existência a presença de algo que transcende o Homem. A vertente espiritual do homem é predominante na análise que estes filósofos fazem acerca do sentido da vida. O conceito de pessoa, como entidade espiritual, liga-se a uma mundividência (uma visão do mundo) que não abdica de uma entidade supra-individual (que ultrapassa o indivíduo). Assim sendo, a pessoa realiza-se e encontra o seu sentido quando age e caminha em direcção à sua realização espiritual e, por consequência, segue os caminhos trilhados por essa entidade divina. Num texto que Kierkegaard escreveu mostra-se como a vida do homem deverá ser. Assim, retrata a vida de Abraão como exemplo da realização plena do homem. Sabem que Abraão era um profeta que esteve, segundo relatos bíblicos, perante Deus. Este, para avaliar a sua fé, exige que Abraão mate o filho. Perante este aparente absurdo, este incomensurável desequilíbrio emocional, este paradoxo, como a sua fé era grande, Abraão pegou logo no filho para executar a ordem. Eis senão, Deus, perante aquele desempenho religioso, ordenou que parasse. Esta história serve para Kierkegaard exemplificar em que consiste a existência autêntica do Homem e a sua verdadeira realização como ser predominantemente espiritual.

Este patamar da vida do Homem diferencia-se daquelas formas existenciais que se caracterizam por querer gozar a vida somente através do prazer corporal (comer bem, dormir bem, entre outras coisas). A estes Kierkegaard situa-os num estádio existencial estético. Além destes, existe outro estádio apelidado de ético. Apesar deste se caracterizar por uma vertente moral (fazer o bem ao próximo, não abusar das pessoas, etc), nunca se assemelha à qualidade existencial do estádio religioso, descrito anteriormente[1].



§  Aqueles para quem é o próprio ser humano que constrói o sentido da sua existência.


Alguns pensadores, não acreditando em algum plano divino que forneça sentido à vida, depositam no próprio homem as suas esperanças. K. Marx e Nietzsche, dois filósofos alemães do séc. XIX, protagonizaram esta vertente existencial. Para Nietzsche, o homem, com a morte de Deus, encontrou-se consigo mesmo realizando a sua própria essência através das criações. Por este motivo, todo o homem deveria construir-se como super-homem (não estou a brincar, a expressão é mesmo de Nietzsche), abdicando de qualquer cultura de rebanho em que as ovelhas seguem o pastor como se fossem meros servis. Este novo alento dado ao Homem desencadeou uma recuperação do valor dado ao poder de transformar, ao poder de cria. Assim, o sentido da vida encontra o seu relevo no próprio homem e na capacidade que ele possui de realização.

Outras teorias filosóficas florescem neste meio. É o caso das utopias difundidas acerca da construção de uma espécie de paraíso na Terra, como é exemplo o Comunismo. Não entrando em divagações, poderemos dizer que também estes filósofos realçam o poder do Homem, demonstrando uma confiança nas suas capacidades. Este optimismo é fruto da perspectiva que considera o Homem como fazedor da realidade e da história, e cuja construção leva a uma progressiva melhoria da situação existencial, na medida em que se criam sistemas cada vez mais perfeitos de justiça, liberdade e solidariedade. Em suma, estas tendências filosóficas pretendem que o Homem reassuma o seu lugar no cosmos, assumindo a sua insignificância e a sua fragilidade e, por isso, a tomada de consciência acerca das suas próprias possibilidades. A noção do desenvolvimento só provém do facto do Homem ser perfeitamente frágil e imperfeito.




sexta-feira, 1 de junho de 2012

O sentido da existência I


O sentido da existência



Esta matéria, como já devem ter reparado, é um pouco chata. Tal facto fica-se a dever à necessidade que vós, e todas as pessoas, tendes de pensar em coisas bem mais interessantes, como serve de exemplo saborear um belo gelado! É só um exemplo.

Efectivamente, questões como para onde vou?, O que me espera?, O que é o Homem?, qual o sentido da minha existência?, Porque estudo? Para que nos serve o que estudámos? são problemáticas que, felizmente, ainda não se encontram nas vossas reais preocupações e preferências.

Contudo, existem filósofos que pensam sobre estas coisas, muitos deles com aspectos interessantes, outros nem por isso. Vamos dar, então, início ao nosso caminho pelas problemáticas existencialistas.

Na história da filosofia existem várias posições acerca do presente tema. Fazendo um breve síntese, poderemos dizer que as tendências filosóficas que se debruçaram sobre o sentido da existência dividem-se em duas grandes orientações:



As que negam um sentido para a existência
As que admitem um sentido para a existência
Negam a existência de qualquer tipo de transcendência (algo de ultrapassa cada indivíduo, que o comanda e para o qual tende) ou mesmo de racionalidade para a existência. O ser humano é apenas um animal, aparentemente mais evoluído que os restantes que habitam o planeta, constantemente envolvido nas lutas de poder que constituem a luta pela sobrevivência, uma espécie que, devido aos acasos das mutações genéticas, às transformações planetárias e à sua própria acção, está fazendo um percurso no tempo e que perecerá (desaparecerá) quando a fonte de energia do nosso sistema planetário (o sol) se extinguir, tal como se extingue a vida de cada um dos indivíduos. A existência é, por isso, um absurdo sem qualquer espécie de sentido.
a)      Aceitam uma transcendência divina e concebem os seres humanos como criaturas de Deus, dotados de uma essência ou alma divina que os diferencia radicalmente dos restantes seres vivos. Embora a vida individual se extinga com a morte, admitem que não termina aí a sua aventura pois, sendo a alma imortal, continuará a existir após a morte. Acreditam numa vida espiritual antes e depois da morte biológica. É o caso das religiões.

b)      Embora não admitam uma transcendência divina, admitem que há uma racionalidade na História (é o caso do comunismo e marxismo). Os actos humanos, nomeadamente as formas económicas, revelam um sentido da história humana, quer realizando um ideal inerente à actividade humana (ausência de classes sociais para o comunismo), quer um realizando um ideal hedonista, de prazer e consumo (como o capitalismo). Também podem aparecer ideais de paz e harmonia.

domingo, 4 de março de 2012

Conjugar as duas formulações do imperativo categórico.


Existem duas formulações do imperativo categórico:
Diz Kant que «há um imperativo que, sem se basear como condição em qualquer outra intenção a atingir por um certo comportamento, ordena imediatamente este comportamento. Este imperativo é categórico. Não se relaciona com a matéria da acção e com o que dela deve resultar, mas com a forma e o princípio de que ela mesma deriva...» (Kant, Fundamentação da Metafísica dos Costumes, Ed.70, pág. 52). Depois deste prelúdio, Kant enuncia o imperativo categórico desta forma: age apenas segundo uma máxima tal que possas ao mesmo tempo querer que ela se torne lei universal (op cit, pág, 59), acrescentando-lhe outra versão: «age de tal maneira que uses a humanidade, tanto na tua pessoa como na pessoa de qualquer outro, sempre e simultaneamente como fim e nunca simplesmente como meio(op.cit, pág.69). 


Segundo Kant, a passagem do primeiro para o segundo princípio baseia-se na necessidade de demonstrar que a lei necessária (imperativo categórico) está intimamente associada ao conceito de vontade de um ser racional em geral, isto é, procura-se saber se a lei corresponde às características fundamentais de  um ser racional e se nele está implícita a boa vontade.

Considera Kant que o ser racional corresponde à noção de pessoa, entidade que possui características muito particulares que lhe fornece dignidade. O que é possuir dignidade? É ter a capacidade de julgar, escolher, possuir os seus próprios objectivos. Por isso, distingue-se dos meros objectos por estes serem meros meios que se utilizam para alcançar determinados fins. Tratar as pessoas como fins significa respeitar a sua racionalidade e, consequentemente, a sua dignidade. Por este motivo, quando coloco os meus interesses à frente de todos os outros, estou a agir no sentido de privilegiar as minhas necessidades. Consequentemente, utilizar os outros como meios consiste em negar a primeira formulação do imperativo categórico, isto é, ao colocar o mobil da ação nos meus interesses particulares estou a negar o alcance universal.

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Condições necessárias e suficientes para produzir conhecimento


Conhecimento e Crença


Por crença entendemos qualquer tipo de convicção. Não é concebível elaborar conhecimento sem que se acredite no que se afirma. Daí que a crença seja condição necessária[1]para o conhecimento.
Por isso considera-se contraditória a seguinte afirmação:

Sei que  a terra é redonda, mas não acredito nisso.
                               

A crença é uma condição necessária na medida em que é um aspecto fundamental para que haja conhecimento, mas não é suficiente porque, além da crença, há outros factores que, em conjunto, são condições necessárias e suficientes.

Conhecimento e Verdade

Como não podemos ficar pelas crenças, temos de procurar outras condições que completem essa crença. Assim, posso acrescentar que a crença, para produzir conhecimento, tem de ser verdadeira. Quando digo que Maria está na praia tenho de ter um conhecimento factivo[2] de que a Maria está na praia. Se simplesmente julgar, erradamente, que Maria está na praia estou a ter uma crença falsa. Portanto, sem verdade não há conhecimento.

Ex: O Ambrósio sabe que o céu é castanho. Esta proposição viola a facticidade do conhecimento e, por isso, é falsa

Mas será a crença verdadeira condição necessária e suficiente para o conhecimento?

Mais uma vez só podemos afirmar que é uma condição necessária. Porquê?

Há situações em que tenho uma pretensa crença verdadeira, mas que só por acaso é verdadeira. Se se perguntar ao aluno Luisão qual a raiz quadrada de 4 e ele responder, sem convicção e certeza, que é 2, estamos perante um acaso. Logo, é necessário algo mais para produzirmos conhecimento. Uma crença verdadeira é quando julgamos que a crença julga a realidade tal como ela é, mas só por si não garante que se alcance o conhecimento

Conhecimento e Justificação

Resulta do que ficou dito que o conhecimento não pode ser consequência do acaso. A crença verdadeira é uma condição necessária mas não suficiente para o conhecimento se processar. Por isso, devemos pressupor que é necessário algo mais; é fundamental, tal como refere Platão em Teeteto, numa justificação.

A justificação é uma condição necessária para o conhecimento. Apresentar as razões para confirmar a veracidade de uma crença é indispensável para produzir conhecimento. Justificar é fazer uma ligação efectiva entre a crença e a realidade.


A justificação pode revestir-se de duas formas:

a)     através de um argumento. Os argumentos justificam afirmações a partir de outras;
b)     Através dos sentidos, ou seja, directamente (se Ambrósio visse a meia cheia de presentes).

Conclusão:


Conhecimento será, então, uma crença verdadeira justificada.

S conhece P se e só se: 1) S acredita em P.
                                      2) P é verdadeira.
                                      3) S tem uma justificação para acreditar em P.



[1] Condição necessária: viver em Portugal é condição necessária para viver em Bragança.

Condição suficiente: viver em Portugal é condição suficiente para viver na Europa.

[2] Dizer que é factivo significa que o conhecimento não pode ser falso