segunda-feira, 4 de junho de 2012

O Sentido da Existência II


§  Aqueles para quem a existência não tem qualquer sentido.



Encontram-se dois filósofos que se enquadram nesta perspectiva: os franceses J.P. Sartre e Albert Camus.



Vamos começar por este último. O texto entregue pelo vosso professor é retirado do livro O Mito de Sísifo. Sísifo é para Camus o protótipo de existência, na medida em que revela o absurdo que a caracteriza. Sísifo foi um gigante condenado pelos deuses a empurrar eternamente até ao topo de uma montanha uma pedra que cai sem cessar mal é colocada lá no cimo. É uma situação absurda, esta do gigante! Transporta a pedra sabendo que vai imediatamente cair depois do esforço desempenhado. Para Camus, o homem é como o gigante, desenvolve um trabalho inútil e sem esperança. Contudo, nem tudo é negativo. Sem qualquer tipo de constrangimento, o gigante, tal como o homem, está entregue a si mesmo, nada o ultrapassa, está vinculado ao seu próprio esforço. Para Sísifo, como para a humanidade, tudo está bem. O Homem absurdo diz sim e o seu esforço nunca mais cessará, ele sabe-se senhor dos seus dias. Nada existe que o suplante e o negue, nada há que o transcenda. Aquando da sua condenação pelos deuses, obviamente que Sísifo sentia o enclausuramento, porém, à medida que a sua eterna tarefa prosseguia, Sísifo foi tomando consciência que estava só, entregue a si mesmo, sem qualquer tipo de acção divina. Sentia-se livre. Talvez seja esta a especial e única predilecção humana: ser feliz com o seu próprio esforço.



- Deveis estar assim a pensar: Estes indivíduos não tinham mais nada para fazer?



J.P. Sartre, filósofo francês, viveu numa época que tornava urgente uma reflexão acerca do homem. Após a Segunda Guerra Mundial, que devastou o mundo, muitas perguntas se fizeram quanto ao sentido da existência. Obviamente que, enquanto há prosperidade económica as pessoas nem sequer têm tempo de pensar nelas próprias, mas, quando o Homem se depara com situações de destruição e crise, tem necessidade de se questionar.

Na linha de Camus, Sartre diz: a existência precede a essência. Esta asserção sintetiza de forma evidente toda a filosofia de Sartre. Basicamente, esta frase evidencia que nada predestina o Homem. É ele que se faz a si próprio. Este modo de se fazer possui, porém, aspectos relevantes. Fazer significa existir. Mas como devemos existir? Existimos como um «eu» se optar, construir, desejar, escolher, demonstrar vontade. Ou seja, o homem só tem uma maneira de existir, é fazendo-se. Na medida em que ele não está já feito, a sua essência, aquilo que ele é, consiste numa permanente construção contínua desse «eu» no sentido de construir a sua própria liberdade.

Sem Deus, com o homem entregue a si próprio, ele está condenado a ser livre. Torna-se inevitável ao homem exercer a liberdade, tornando-se ele próprio dono das suas decisões e opções e, por isso, o único responsável por tudo aquilo que faz. O homem não encontra fora de si algo a que se possa apoiar, como muleta das suas desventuras. Não! O homem encontra-se a si próprio, está abandonado, para o bem e para o mal. É por este motivo que todas as pessoas reclamam pela liberdade, mas nem toda a gente sabe exercê-la.



§  Aqueles para quem a existência tem um sentido.



É comum conotar uma parte da filosofia existencialista com uma vertente cristã. Efectivamente existem filósofos como Kierkegaard, Mounier, Gabriel Marcel, que introduzem na questão da existência a presença de algo que transcende o Homem. A vertente espiritual do homem é predominante na análise que estes filósofos fazem acerca do sentido da vida. O conceito de pessoa, como entidade espiritual, liga-se a uma mundividência (uma visão do mundo) que não abdica de uma entidade supra-individual (que ultrapassa o indivíduo). Assim sendo, a pessoa realiza-se e encontra o seu sentido quando age e caminha em direcção à sua realização espiritual e, por consequência, segue os caminhos trilhados por essa entidade divina. Num texto que Kierkegaard escreveu mostra-se como a vida do homem deverá ser. Assim, retrata a vida de Abraão como exemplo da realização plena do homem. Sabem que Abraão era um profeta que esteve, segundo relatos bíblicos, perante Deus. Este, para avaliar a sua fé, exige que Abraão mate o filho. Perante este aparente absurdo, este incomensurável desequilíbrio emocional, este paradoxo, como a sua fé era grande, Abraão pegou logo no filho para executar a ordem. Eis senão, Deus, perante aquele desempenho religioso, ordenou que parasse. Esta história serve para Kierkegaard exemplificar em que consiste a existência autêntica do Homem e a sua verdadeira realização como ser predominantemente espiritual.

Este patamar da vida do Homem diferencia-se daquelas formas existenciais que se caracterizam por querer gozar a vida somente através do prazer corporal (comer bem, dormir bem, entre outras coisas). A estes Kierkegaard situa-os num estádio existencial estético. Além destes, existe outro estádio apelidado de ético. Apesar deste se caracterizar por uma vertente moral (fazer o bem ao próximo, não abusar das pessoas, etc), nunca se assemelha à qualidade existencial do estádio religioso, descrito anteriormente[1].



§  Aqueles para quem é o próprio ser humano que constrói o sentido da sua existência.


Alguns pensadores, não acreditando em algum plano divino que forneça sentido à vida, depositam no próprio homem as suas esperanças. K. Marx e Nietzsche, dois filósofos alemães do séc. XIX, protagonizaram esta vertente existencial. Para Nietzsche, o homem, com a morte de Deus, encontrou-se consigo mesmo realizando a sua própria essência através das criações. Por este motivo, todo o homem deveria construir-se como super-homem (não estou a brincar, a expressão é mesmo de Nietzsche), abdicando de qualquer cultura de rebanho em que as ovelhas seguem o pastor como se fossem meros servis. Este novo alento dado ao Homem desencadeou uma recuperação do valor dado ao poder de transformar, ao poder de cria. Assim, o sentido da vida encontra o seu relevo no próprio homem e na capacidade que ele possui de realização.

Outras teorias filosóficas florescem neste meio. É o caso das utopias difundidas acerca da construção de uma espécie de paraíso na Terra, como é exemplo o Comunismo. Não entrando em divagações, poderemos dizer que também estes filósofos realçam o poder do Homem, demonstrando uma confiança nas suas capacidades. Este optimismo é fruto da perspectiva que considera o Homem como fazedor da realidade e da história, e cuja construção leva a uma progressiva melhoria da situação existencial, na medida em que se criam sistemas cada vez mais perfeitos de justiça, liberdade e solidariedade. Em suma, estas tendências filosóficas pretendem que o Homem reassuma o seu lugar no cosmos, assumindo a sua insignificância e a sua fragilidade e, por isso, a tomada de consciência acerca das suas próprias possibilidades. A noção do desenvolvimento só provém do facto do Homem ser perfeitamente frágil e imperfeito.




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