Filósofo austríaco, controverso, conhecido por sair pela janela depois das aulas e arrancar com a sua potente moto, escreveu obras importantes
ao nível da epistemologia: Adeus à Razão,
Contra o Método, Ciência numa Sociedade Livre, são obras marcantes e
simultaneamente sintomáticas do seu projeto epistemológico.
Contraindução, a ideia de progresso científico, a
incomensurabilidade das teorias e a condição de coerência são os conceitos mais
pertinentes.
Com recurso permanente à história da ciência, F. tenta provar
a máxima de que as alterações científicas se deram por um processo anárquico.
«Vale tudo» é a nova metodologia, provando que a história nas suas mais
variadas vertentes, é multiforme e variada, estando repleta de acidentes e
justaposição de eventos, tal como acontece no desenvolvimento considerado em
sentido lato. Percorrendo a história civilizacional da Europa, e recorrendo a
Mill, F considera que a civilização europeia alcançou certo patamar de
desenvolvimento, não por encerrar uma qualquer excelência superior, mas por
promover uma grande variedade de caminhos (Adeus à Razão, pág 45). Mesmo
havendo aqui ou ali alguma intolerância e tentativa de imposição das ideias,
raramente tal aconteceu. O anarquismo metodológico favorece a concretização do
progresso em qualquer dos sentidos. Grande parte do mundo é desconhecida pelo
que se deve estar aberto a alternativas. O que se deve exigir de um cientista?
Polivalência e Versatilidade.
Existem inúmeras provas de que assim deve ser, ou pelo menos
de que assim é. F. , ao contrário de Popper, não quer demonstrar que a ciência
deva ser de tal forma, mas que os procedimentos são de certa forma. No desenvolvimento
da criança a actividade lúdica inicial é um requisito básico para a
compreensão. O adestramento torna a pessoa obediente mesmo perante algumas
perplexidades. A uniformidade debilita o poder crítico.
Contraindução
O cientista terá, assim, uma única via: aceitar todas as
outras. Numa crítica à ciência, F advoga a persecução de metodologias
diferenciadas e pluralistas. Habitualmente o trabalho científico é conservador,
mono dinâmico e visa essencialmente tornar forte o argumento fraco. Como?
Optando por metodologias unívocas e impostas. Ora, este procedimento é
contrário àquilo que F pretende porque pressupõe uma atitude ingénua face ao
homem e à circunstância social.
O método tradicional empírico-indutivo baseia o progresso de
uma teoria a partir do confronto com factos, indo ao encontro da noção que F
introduz de Condição de Coerência (Contra
o Método, pág 47 e ss).
Não existem factos brutos. Os factos científicos puros são
reflexo de uma aceitação dogmática dos procedimentos metodológicos impostos e impedem
o alcance da melhoria dos conhecimentos. Baseando-se mais uma vez em Mill
(Adeus à Razão, 46 e ss), F. apresenta um conjunto de razões para a defesa da
diversidade metodológica:
1. Uma
perspetiva rejeitada pode conter alguma verdade.
2. Somos
falíveis quando às nossas ideias.
3. Uma verdade
incontestada será considerada um preconceito.
4. A sua
adesão é meramente formal, a não ser que seja confrontada.
5. Proibir o
confronto com outras teorias significa contrariar a própria essência da ciência.
Não aceitar isto é não aceitar a ciência. Contudo, uma
pequena ressalva. F. não abdica da necessária seriedade científica nem mesmo do
seu método recorrente – o empírico indutivo. A sua crítica é estabelecida pela
forma como este método é aplicado e pela maneira como se estabelece a demarcação
entre ciência e não ciência. Em conformidade com isto, a objeção de F.
aplica-se àquilo que as teorias consideram racional num dado momento.
Recorrendo a Galileu, F afirma que as suas teorias foram consideradas
irracionais relativamente ao status quo científico dominado pelo paradigma
aristotélico. Sendo assim, parece mais vantajoso aceitar as teorias que à
partida são consideradas irracionais a aceitar simplesmente os facto que podem
ou não sustentar a teoria existente. Por este motivo, F afasta-se de Popper.
Enquanto Popper afirma a necessidade de testes, F afirma a importância de
aceitação das teorias diferentes e consideradas irracionais para a época.
A ideia de incomensurabilidade das teorias, a par de Kuhn,
também é advogada por F. A ideia base é a constatação de que não existem factos
brutos e que, por isso, a observação depende da teoria. Não existem observações
puras. Assim como na mecânica clássica todos os objetos físicos têm forma,
massa e volume, na teoria da relatividade o que existe são relações entre
objetos de acordo com um certo ponto de referência. Como consequência,
qualquer enunciado observacional que se refira a objetos físicos dentro da
mecânica clássica terá um significado diferente para um enunciado observacional
aparentemente similar na teoria da relatividade. Não existe um processo cumulativo,
antes se assiste a uma rotura. Da mesma forma, a teoria ondulatória só ocorreu
porque alguns decidiram não se deixar limitar por certas regras. Sem o mau uso
da linguagem não pode haver progresso nem descoberta.
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